O que esperar de 2022?

Eu acho que, de cara, todo mundo ouve essa pergunta e pensa: “o pior”. Vai ser um ano muito difícil em vários aspectos, né? A perspectiva econômica que a gente tem, as incertezas, a dúvida sobre se a pandemia acabou ou não, se vão surgir novos picos de casos, se a gente vai poder tirar a máscara, vai poder voltar a vida àquele normal que a gente conhecia.

Mas é… você sabe o que vai ser o pior: ano que vem é ano de eleição. E eu acho que agora é o momento de a gente começar a se preparar pelo que vem por aí. Vai ser um ano de muita polarização, daquelas brigas na internet, o almoço de família tenso porque tem aquele tio que discorda daquela tia, aquele primo que quer sempre ter razão, aquela enxurrada de mentiras de sempre.

Aliás, pra quem não está acompanhando, o Facebook está passando por uma série de denúncias de ex-funcionários mostrando como a empresa lucra com o ódio. Como eles dão mais visibilidade pra posts que vão gerar discussões, que vão gerar briga, do que pra posts tranquilos, sem polêmica.

É, é isso mesmo. O seu tio está brigando no WhatsApp, a sua prima vai levar aquele climão pra Ceia de Natal, aquele amigo do futebol ou aquela colega de trabalho falam aquele monte de asneira pra tirar a gente do sério… porque tem uma estrutura gigantesca no mundo que está manipulando a gente… pra brigar.

E mais: as revelações mostraram que, aqui no Brasil, o conteúdo tóxico tem ainda mais alcance.

Por quê? Money. Porque dá lucro.

É claro, é muito mais fácil manipular aquelas pessoas que têm menos recursos pra diferenciar o que é uma notícia falsa de uma verdadeira, por exemplo. Ou pessoas que estão propensas a ter medo: você cria um bicho papão, o comunismo, o marxismo cultural, a corrupção… e começa a alimentar as pessoas com esse medo. Pronto, tá feita a fórmula pra dar briga.

E aí coisas pequenas, picuinhas, passam a ser mais importantes do que as grandes mudanças estruturais de que a gente precisa. Vou dar um exemplo: na educação. Quando a gente deixa de pensar qual é o grande projeto de educação do país, quais vão ser as formas de ampliar o acesso universal a um curso superior ou um plano de carreira pros professores, pra discutir se pode ter uma questão sobre homossexualidade no Enem, você está reduzindo um projeto de país a uma banalidade.

(E é claro que pode ter uma questão sobre homossexualidade no Enem.)

É óbvio que existem problemas de ordem prática, que afetam – e muito – a vida de todo mundo. O preço do gás, da gasolina, da conta de luz, o peso disso tudo na inflação, no poder de compra. Um veto a um projeto cultural, uma portaria desobrigando funcionários de apresentarem comprovante de vacina. Isso tudo é assunto pra gente debater no dia-a-dia. Mas quando a gente é manipulado e estimulado pelas redes sociais a brigar – porque isso dá lucro pra elas -, a gente abre mão de discutir a sociedade que a gente quer ser.

Qual é o grande projeto de país que a gente tem hoje? Independente de quem você vai escolher pra votar no ano que vem, o que você acha que tem que ser o Brasil? Se você encontrasse com um gringo e ele te perguntasse: “como é viver no Brasil?”, o que você gostaria de responder? Como você acha que o país deveria se comportar na questão climática? Qual tem que ser nosso projeto de desenvolvimento? De combate à desigualdade? De crescimento econômico? De geração de empregos? De planejamento cultural?

Há quanto tempo a gente está nessas discussões pequenas, inférteis, improdutivas sobre a intimidade da vida dos outros, sobre burrice – que existe e não é pouca, é verdade – quando a gente deveria falar sobre a sociedade como um todo, as mudanças de que a gente precisa? Há quanto tempo a gente não vê ideias de um grande projeto para o Brasil?

A última eleição mostrou claramente o quanto o ódio prevaleceu – e continuou, nas redes sociais. A gente não discutiu o Brasil, faltou clareza nas propostas… bom, teve gente que nem participou de debate, as pessoas assinaram um cheque em branco, votaram sem conhecer projeto.

Então quando eu me pergunto o que esperar de 2022, primeiro, eu queria que todo mundo tivesse isso em mente: quem quer que a gente brigue está lucrando com as nossas brigas. E, no final, é isso que eu desejo: que a gente possa discutir o Brasil. Com seriedade, respeitando as diferenças e com muito menos ódio.

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